segunda-feira, 19 de março de 2012

O destino de Fortunato - texto sem parágrafos

Fortunato sempre soube que era diferente. Não porque as outras crianças brincavam em bando agitadas ou porque a mãe chamava-lhe a atenção para os afazeres da casa, que não eram poucos, mas porque ele sentia que algo de grandioso estava destinado para ele desde sempre. Passava - imóvel - minutos intermináveis, olhando para o nada com se estivesse em estado de espera plena. “Mas esperava o quê?”. Não o sabia, apenas sabia. Tinha certeza de que, na hora certa, ele deveria estar pronto e, para tanto, preparava-se: lia tudo que lhe caía às mãos e conversava com os adultos. Conversa de gente grande, é claro, nada de bobeiras de meninos e meninas. Perguntava sobre a vida, a terra, os mistérios sem respostas e exigia-as sempre e quando queria saciar a curiosidade que lhe corroia a alma, mas nunca conseguia totalmente e, então, nesses momentos, ele parava e - feito estátua - ficava imóvel. Assim passou o tempo e o menino cresceu. Trabalhava de sol a sol, mas não mudava seu jeito peculiar de ser e os outros já não lhe perguntavam nada. Haviam se acostumado. Ele, porém, sabia que a hora se aproximava. Manhosa, ela brincava com o tempo e escapava-lhe toda vez que pressionada. Mas ele aprendera esperar. Então, o grande dia chegou e tudo aconteceu tão de repente e tão natural que foi assim, assim... Fortunato revelou a todos o propósito de sua existência. Reuniu todo mundo na pacata pracinha, subiu ao coreto, pigarreou e falou, falou, falou por quase um tempo inteiro e ninguém se mexeu: todos paralisados ouviram e, quando desceu e se juntou à multidão, todos queriam tocá-lo, abraçá-lo, beijá-lo e foi aquela agitação. Com gestos controlados, desvencilhou-se aos poucos da multidão e partiu sem olhar para trás, partiu para o seu destino.
Cristina Gomes

Texto extraído de:

http://www.agostinet.g12.br/docs/L.Portuguesa/estudo_do_paragrafo_adriana_1s.pdf

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