sábado, 21 de setembro de 2013

Lisbela e o prisioneiro

LISBELA E O PRISIONEIRO é uma comédia romântica e conta a história divertida do malandro, aventureiro e conquistador Leléu (Selton Mello, de A Invenção do Brasil, O Auto da Compadecida, Lavoura Arcaica), e da mocinha sonhadora Lisbela (Débora Falabella, de O Clone, Dois Perdidos em uma Noite Suja), que adora ver filmes americanos e sonha com os heróis do cinema.
  
Lisbela está noiva e de casamento marcado, quando Leléu chega à cidade. O casal se encanta e passa a viver uma história cheia de personagens tirados do cenário nordestino: Inaura, uma mulher casada e sedutora (Virginia Cavendish, de O Cravo e a Rosa, Dona Flor e seus Dois Maridos) que tenta atrair o herói; um marido valentão e "matador", Frederico Evandro (Marco Nanini, de Carlota Joaquina - Princesa do Brasil, O Auto da Compadecida); um pai severo e chefe de polícia, Tenente Guedes (André Mattos, de Como Nascem os Anjos); um pernambucano com sotaque carioca, Douglas (Bruno Garcia, de Os Maias, O Quinto dos Infernos), visto sob o prisma do humor regional; e um "cabo de destacamento", Cabo Citonho (Tadeu Mello, de Xuxa e os Duendes, O Cupido Trapalhão), que é suficientemente astuto para satisfazer os seus apetites.

Lisbela e Leléu vão sofrer pressões da família, do meio social e também com as suas próprias dúvidas e hesitações. Mas, em uma reviravolta final, cheia de bravura e humor, eles seguem seus destinos. Como a própria Lisbela diz, a graça não é saber o que acontece. É saber como acontece. Quando acontece.

Apesar da história se passar no nordeste brasileiro, os dramas destas personagens, suas aflições e sonhos são universais. Não se trata, portanto, de um filme regionalista, embora se utilize com inteligência dos recursos interessantes que uma história nordestina pode trazer, como o colorido das paisagens, o sotaque alegre e algumas tradições regionais.

Mesmo as personagens mais caricatas, como o Cabo Citonho, vivido por Tadeu Mello, funcionam com todos os seus trejeitos sem forçar a barra para ser engraçado. De modo geral, a escolha do elenco foi muito acertada: Selton Mello tem a mistura certa da doçura com a malandragem. Débora Falabella está perfeita no papel, com alegria, pureza e beleza transbordantes. Bruno Garcia sempre uma carta na manga do diretor, do popular ao irritante num pulo. Virginia Cavendish, uma das mentoras do projeto, linda, sensual e provocante, bem diferente da sua personagem boa moça de "O Auto da Compadecida". André Mattos já provou ser mais do que carismático e Marco Nanini fecha tudo com chave de ouro. Seu vilão cruel de olhos vermelhos e cabelos crespos dá o equilíbrio que a história exige, sem se tornar pesada demais.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Fala, amendoeira

Fala, amendoeira

Esse ofício de rabiscar sobre as coisas do tempo exige que prestemos alguma atenção à natureza – essa natureza que não presta atenção em nós. Abrindo a janela matinal, o cronista deparou no firmamento, que seria de uma safira impecável se não houvesse a longa barra de névoa a toldar a linha entre céu e chão – névoa baixa e seca, hostil aos aviões. Pousou a vista, depois, nas árvores que algum remoto prefeito deu à rua, e que ainda ninguém se lembrou de arrancar, talvez porque haja outras destruições mais urgentes.  Estavam todas verdes, menos uma. Uma que, precisamente, lá está plantada em frente à porta, companheira mais chegada de um homem e sua vida, espécie de anjo vegetal proposto ao seu destino.
Essa árvore de certo modo incorporada aos bens pessoais, alguns fios elétricos lhe atravessam a fronde, sem que a molestem, e a luz crua do projetor, a dois passos, a impediria talvez de dormir, se ela fosse mais nova. Às terças, pela manhã, o feirante nela encosta sua barraca, e, ao entardecer, cada dia, garotos procuram subir-lhe pelo tronco. Nenhum desses incômodos lhe afeta a placidez de árvore madura e magra, que já viu muita chuva, muito cortejo de casamento, muitos enterros, e serve há longos anos à necessidade de sombra que têm os amantes de rua, e mesmo a outras precisões mais humildes de cãezinhos transeuntes.
Todas estavam ainda verdes, mas essa ostentava algumas folhas amarelas e outras já estriadas de vermelho, numa gradação fantasista que chegava mesmo até o marrom – cor final de decomposição, depois da qual as folhas caem. Pequenas amêndoas atestavam seu esforço, e também elas se preparavam para ganhar coloração dourada e, por sua vez, completado o ciclo, tombar sobre o meio-fio, se não as colhe algum moleque apreciador de seu azedinho. É como se o cronista, lhe perguntasse – Fala, amendoeira – por que fugia ao rito de suas irmãs, adotando vestes assim particulares, a árvore pareceu explicar-lhe:
-- Não vês? Começo a outonear. É 21 de março, data em que as folhinhas assinalam o equinócio do outono. Cumpro meu dever de árvore, embora minhas irmãs não respeitem as estações.
-- E vais outoneando sozinha?
-- Na medida do possível. Anda tudo muito desorganizado, e, como deves notar, trago comigo um resto de verão, uma antecipação de primavera e mesmo, se reparares bem neste ventinho que me fustiga pela madrugada, uma suspeita de inverno.
-- Somos todos assim.
-- Os homens, não. Em ti, por exemplo, o outono é manifesto e exclusivo. Acho-te bem outonal, meu filho, e teu trabalho é exatamente o que os autores chamam de outonada: são frutos colhidos numa hora da vida que já não é clara, mas ainda não se dilui em treva. Repara que o outono é mais estação da alma que da natureza.
-- Não me entristeças.
-- Não, querido, sou tua árvore-de-guarda e simbolizo teu outono pessoal. Quero apenas que te outonize com paciência e doçura. O dardo de luz fere menos, a chuva dá às frutas seu definitivo sabor. As folhas caem, é certo, e os cabelos também, mas há alguma coisa de gracioso em tudo isso: parábolas, ritmos, tons suaves... Outoniza-se com dignidade, meu velho.
(Carlos Drummond de Andrade)

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Processo de formação de palavras por composição



 Composição é o processo que forma palavras compostas, a partir da junção de dois ou mais radicais*. Existem dois tipos:

              Composição por Justaposição

                Ao juntarmos duas ou mais palavras ou radicais, não ocorre alteração fonética.

              Exemplos:

                passatempo, quinta-feira, girassol, couve-flor
               Obs.: em "girassol" houve uma alteração na grafia (acréscimo de um "s") justamente para manter inalterada a sonoridade da palavra.

               Composição por Aglutinação

               Ao unirmos dois ou mais vocábulos ou radicais, ocorre supressão de um ou mais de seus elementos fonéticos.

              Exemplos:

             embora (em boa hora)
              fidalgo (filho de algo - referindo-se à família nobre)
             hidrelétrico (hidro + elétrico)
             planalto (plano alto)
              Obs.: ao aglutinarem-se, os componentes subordinam-se a um só acento tônico, o do último componente.

             *Radical
              É a parte da palavra que tem significado. Também chamado de morfema lexical.

               TERR – radical da palavra terra, terreiro ou terraço.
              CAMP – radical da palavra campo, campestre.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Correspondência (Millôr Fernandes)

Correspondência

"Aquele rapazinho escreveu esta carta para o irmão:

Querido mano,
Anteontem futebolei bastante com uns amigos. Depois cigarrei um pouco e nos divertimos montanhando, até que o dia anoiteceu. Então desmontanhamos, nos amesamos, sopamos, arrozamos, bifamos, ensopadamos e cafezamos. Em seguida, varandamos. No dia seguinte, cavalamos muito.
Maninho

O irmão respondeu:

Maninho,
Ontem livrei-me pela manhã, à tarde cinemei e à noite, com papai e mamãe, teatramos. Hoje colegiei, ao meio-dia me leitei e às três papelei-me e canetei-me para escriturar-te. E paragrafrarei finalmente aqui porque é hora de adeusar-te, pois ainda tenho que correiar esta carta para ti e os relógios já estão cincando.
De teu irmão,
Fratelo"

(Millôr Fernandes)